Sweet Dreams
Sweet Dreams
(Eurythmics)
Escuridão completa. Acho que estou num sonho, mas não tenho certeza se realmente peguei no sono. Há uma presença ao redor, entretanto não consigo localizá-la. Até que vejo uma mão sobre minha cabeça. Ela segura uma faca enorme, tão afiada que chega a brilhar (embora não sei de onde vem a luz que a ilumina). Desce certeira em meu pescoço, deslizando em minha carne suavemente. Meu sangue espalha-se por todo lado, jorra pelo corpo inteiro, um rio caudaloso que segue inexorável por margens invisíveis. Acordo assustado, só que nada realmente aconteceu. Volto a dormir, ou ao menos tento.
Na noite seguinte, o ritual se repete. Ainda estou incerto se realmente durmo. Novamente encontro-me só na escuridão. Sinto um vento frio. O silêncio é absoluto. Por fim a mão aparece, desta vez portando uma pistola calibre 38. Aponta na direção da minha testa e aperta o gatilho. Caio com um buraco na cabeça, de onde o sangue se esvai, mas antes de tocar o chão desperto.
Mais uma noite, mais uma vez encontro-me solitário em meio às trevas. Fico por um bom tempo parado, sem nada acontecer. Até que a famigerada mão se faz presente: atinge meus olhos com um soco inglês, deixando-me cego por alguns instantes. É o suficiente para que me espanque, deformando todo o meu rosto, me fazendo cuspir sangue e todos os dentes. A beira de perder a consciência, percebo que era apenas outro sonho.
Novamente estou na escuridão, agora preso em uma guilhotina. A mão cumpre seu serviço fazendo a lâmina descer e separar minha cabeça de meu corpo.
Tento evitar dormir, mas não consigo. Quando me vejo perdido no escuro, corro em desespero. Todavia, meus esforços são inúteis. A mão me persegue com uma tocha, e por mais que tente, ela não se distancia. Quando finalmente canso, meu crânio fica em chamas. O calor é tão forte que me faz despertar.
Decido que não irei mais fugir, não quero a cada noite sentir a morte de um jeito diferente. Tomo um banho, troco de roupa, acendo incensos. Só meditando conseguirei descobrir o que realmente acontece. Concentro-me na escuridão, até me enxergar nela. Logo noto a mão atrás de mim. Agora ela está vazia. Não desvio meu olhar, vou seguindo o braço, peito, pescoço. Vejo que o dono da mão sou eu, ou meu reflexo. O duplo gargalha ao notar meu espanto e diz: "Você nunca conseguirá fugir de si mesmo".
Mais de um ano se passou desde então. Todas as noites encontro comigo mesmo e assisto a meu duplo me matar. Acho que estou mais próximo do momento em que ficarei de vez pela escuridão. A cada dia este pensamento torna-se mais reconfortante.
Imagem: auto-retrato.
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