Where Is My Mind?
Where Is My Mind?
(Pixies)
Ontem acordei me sentido esquisito, com alguma coisa por dentro me incomodando, uma certa queimação no estômago. Não quis dirigir, fui para o trabalho de ônibus. O engarrafamento estava ainda pior do que o normal. No meio do caminho senti uma dor de barriga aguda, sabe aquelas que batem de repente e você já sabe que não tem como resistir? Pois então, tive que descer do coletivo e procurar um banheiro o mais rápido possível.
Acabei entrando numa birosca qualquer. O atendente, um senhor gordo, careca e com barba por fazer, falou que era só ir aos fundos do estabelecimento, para onde prontamente me dirigi. Lá entrando, logo notei a sujeira, aquilo parecia que não era lavado há mais de um mês. O cheiro de urina era insuportável, a porta da “casinha” em que ficava a privada estava quebrada. No fundo do vaso havia uma lembrança sólida do último visitante. Respirei fundo, tentando criar coragem. Quando senti uma pontada no ventre, vi que não tinha jeito, o negócio foi abaixar as calças e soltar o jato ali mesmo.
No início, senti uns respingos na bunda. Preferi ignorá-los. Depois de descarregar a primeira remessa, percebi que uma segunda estava a caminho. Concentrei-me então para terminar com o serviço sem demora, só que tive que fazer uma força tremenda. O bicho não queria sair, era grande demais. Já estava suando frio quando finalmente ouvi o “plop” dele batendo na água.
Aliviado, usei o papel de qualidade ruim para me limpar – inclusive o suor espalhado por todo meu corpo. Ao levantar para dar a descarga levei um tremendo susto. No meio das fezes, encontrei um cérebro.
A princípio achei que tinha cagado o meu, mas logo percebi que isso era ridículo. Ainda estava pensando, todas as minhas funções motoras estavam em ordem. Liguei para o meu patrão, disse que estava em uma emergência, não poderia ir trabalhar. Ele concordou, só pediu para levar um atestado médico. Achou que eu estava de malandragem, o danado sempre desconfia de tudo e todos.
Voltei ao bar, perguntei ao atendente se tinha luvas e algum pote que pudesse me dar. Ele disse que luva não tinha, mas se quisesse eu poderia levar uma embalagem de quentinha. Tive que aceitar. Retornei ao banheiro, enfiei a mão dentro do vaso sanitário e, em meio à viscosidade dos dejetos que havia deixado, peguei o cérebro. Ele estava meio sujo, usei o papel para limpá-lo. Em seguida, coloquei-o dentro da quentinha. Depois dei descarga, tentei lavar meu braço da melhor maneira possível – lá não tinha sabonete – e marquei uma consulta de emergência.
O doutor era um senhor de seus cinqüenta anos, cabelos grisalhos, um longo bigode branco, ar de sério. Estranhou minha situação, mas iria me examinar ainda assim. Ele me fez tirar a roupa, me botou de quatro numa cama e assim fiquei, com a bunda para o ar, enquanto o médico botava uma luva branca e pegava uma lanterna. Veio em minha direção e, de repente, sem aviso algum, enfiou o indicador no meu cu, dizendo “vamos ver se está tudo certo por aqui”.
O médico então fez uma cara de dor – o dedo ficou preso dentro de mim. Ao retirar a mão, que notei estar jorrando sangue, gritou com raiva: “O senhor me... mordeu!”. Fiquei sem entender nada, aquilo era impossível! Só que ele confirmou, disse que meu ânus tinha dentes.
“Vem cá, o senhor do nada me dá uma dedada, e depois vem dizer que meu cu te mordeu?” Vesti as calças, parti para cima dele e enfiei-lhe a porrada. Gritei que se arrumasse encrenca ia contar para todo mundo que ele abusava dos pacientes, se isso não fosse suficiente voltaria para matá-lo. O doutor, assustado, me mandou ir embora, falou para que o esquecesse e nunca mais voltasse lá.
Saí do consultório feliz da vida, ter dado porrada em alguém foi muito bom. Desde criança não fazia isso. Resolvi então ir para o trabalho bater no meu chefe. Quando cheguei ao escritório ele estranhou, “Você não tinha ido ao médico?”. Nem respondi, apenas dei um soco na cara dele, que caiu no chão com sangue na boca. Antes que pudesse se recuperar, chutei-o no rosto e no estômago diversas vezes. Todo mundo foi ver o que estava acontecendo. O Tibério, um babaca que fala mal de mim pelas costas, disse que eu devia me acalmar. Fui à direção dele, soquei-o diversas vezes, depois segurei sua cabeça e bati-a contra a parede até ficar toda ensangüentada.
Depois disso saí da cidade. Tenho certeza que alguém chamou a polícia, não vão deixar isso barato. Antes comprei um pequeno espelho e fui num banheiro qualquer de beira de estrada para verificar aquela história de que meu cu tinha dentes. Quando o vi refletido, não havia dente algum, apenas um olho, que deu uma piscada para mim com quem diz “Estamos nessa junto, amigo!”.
Imagem: Un Chien Andalou, dirigido por Luis Buñuel e Salvador Dali.